Mazgani homenageia os seus salvadores. Nós homenageamos o Rei, prostrados diantes das “Lucille” mais significativas que possuiu. Oliver Ackerman fala-nos do novo álbum de A Place To Bury Strangers e nós falamos de algo que mudou a música: há 50 anos Bob Dylan gravou “Highway 61 Revisited”.
Uma cover de Elvis é, nestas linhas, sempre motivo de alguma indignação. Mazgani mexeu com o sagrado no seu novo trabalho e fê-lo de forma suficientemente humilde e igualmente provocadora para querermos perceber, pela primeira vez nesta revista, o encanto de um álbum de covers. A música, as canções, são coisas tão de cada um, dotadas de uma potência de significado e apropriação íntima, que mexer-lhes é um acto de desafio, de coragem.
Há 50 anos atrás, Bob Dylan encheu-se de coragem e entrou em estúdio pronto a desafiar todas as convenções de dois géneros musicais e também as expectativas que o sufocavam. “Highway 61 Revisited” mudou a história da música e, há quem diga, do mundo. Olhamos o álbum sob o signo do blues, ao qual aparentemente queria escapar. Sempre desafiantes são os A Place To Bury Strangers, embora o frontman Oliver Ackerman nos admita que o novo álbum, sendo mais melódico, é bastante agregador. “Transfixiation” é mais um passo de solidificação da banda que se prepara para ocupar um lugar deixado vago pelos Sonic Youth, devido às infidelidades de Thurston Moore.
Há lirismos misóginos que afirmam que todas as mulheres são uma. O lendário B.B. King parecia concordar. Como qualquer bluesman era um devoto da mulher, um amante, tal como das guitarras a que chamou sempre um só nome. Olhamos as 10 “Lucille” mais significativas do Rei. Quando morre alguém como B.B. King, a música não fica mais pobre, nem a vida. Ambas serão sempre mais ricas porque o génio existiu, porque a obra permanece e porque as canções salvam.Mazgani di-lo sem pudor: «A canção não é um empreendimento menor, que se inscreve no território das coisas que não podem salvar». Tal como o músico nos diz do seu disco e da impossibilidade de atingir o intocável, quando um génio nos deixa, o que sentimos não é pobreza, mas humildade. Pois nada nos humilha mais que a impossibilidade e não morrer é impossível.
Qualquer bluesman sabe isto. E, nestes momentos, em que dizemos adeus a B.B. King, todos somos bluesmen.